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Recursos Educativos em Oftalmologia

Dr. Miguel Lume
Dr. Miguel Lume
Com o apoio e colaboração do especialista em Oftalmologia do Hospital Particular - Grupo Saúde, Dr. Miguel Lume.

A Oftalmologia é a especialidade da medicina que se dedica ao diagnóstico e tratamento das doenças dos olhos, que dão origem a diversos problemas de visão.

Tendo em conta os principais diagnósticos de pessoas acompanhadas pela Íris Inclusiva no quadro do desenvolvimento da sua resposta social, pareceu-nos útil pedir a colaboração de um médico para organizar um pequeno guia com informação relevante acerca de um conjunto de patologias da visão, nomeadamente ao nível do diagnóstico e do tratamento.

Assim, contamos com o apoio e colaboração do especialista em Oftalmologia do Hospital Particular - Grupo Saúde, Dr. Miguel Lume, que muito agradecemos.

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Glaucoma (congénito ou adquirido)

O glaucoma é a segunda causa de cegueira irreversível no mundo. Existem várias formas de glaucoma, sendo as principais:
  1. Glaucoma primário de ângulo aberto
  2. Glaucoma primário de ângulo fechado
  3. Glaucoma congénito e de desenvolvimento
  4. Glaucomas secundários.
A forma mais comum de glaucoma é o primário de ângulo aberto, ocorrendo em aproximadamente 2% a 4% da população acima de 40 anos.

Geralmente, o glaucoma de ângulo aberto está associado a Pressão Intraocular (PIO) elevada. No entanto, pode haver indivíduos com PIO elevada e não terem doença e outros com PIO normal e terem doença. No fundo, cada caso deve ser analisado e estudado com ponderação.

O diagnóstico precoce muitas vezes não é imediato, sendo importante o recurso a exames que avaliam o dano estrutural do nervo ótico (Tomografia Ótica Coerente/OCT papilar) e o dano funcional do nervo ótico (campos visuais ou perimetria).

O tratamento do glaucoma pode ser farmacológico ou cirúrgico e consiste em atrasar a progressão da doença através da redução da pressão intra-ocular. Para isso, o médico deve procurar atingir a PIO alvo apropriada para cada doente: uma PIO que o Oftalmologista estima que seja essencial atingir para que a doença não progrida. Ou seja, a PIO alvo varia de doente para doente e depende de exames de controle (em particular, campos visuais) que o doente vai fazendo ao longo do tempo.

Habitualmente, o tratamento do glaucoma primário de ângulo aberto é feito com colírios. Caso este tipo de tratamento médico não seja suficiente, pode-se recorrer ao laser (trabeculoplastia Seletiva, SLT) ou à cirurgia. Em casos graves com grande comprometimento de campo visual ou com ameaça de perda da visão central, pode haver necessidade de recurso imediato e urgente à cirurgia.

Atrofia ótica bilateral

A atrofia ótica bilateral é como o nome indica uma lesão grave de ambos os nervos óticos com consequente perda de função (acuidade visual).

Pode ser causada por doença genética (que afeta as células ganglionares que constituem o nervo ótico) sendo a mais conhecida a Atrofia Ótica Autossómica Dominante. Tipicamente afeta indivíduos na infância com comprometimento da acuidade visual e da discriminação das cores (Tritanopia). Não há tratamento para esta patologia.

A atrofia ótica bilateral também pode ocorrer secundariamente a trauma, doença neurológica central, glaucoma, oclusão venosa retiniana, entre outras patologias.

Distrofia da retina

As distrofias retinianas é um grupo vasto de patologias da retina que se caracterizam pela sua heterogeneidade fenotípica (variedade de manifestações retinianas) e pela sua origem em defeitos genéticos. Estas patologias podem manifestar-se apenas a nível ocular ou envolvendo outras áreas do corpo humano.

A distrofia retiniana mais conhecida é a Retinose Pigmentar, também denominada por Retinite Pigmentar ou distrofia bastonetes-cones. Afeta os fotorrecetores (primeiramente os bastonetes) e uma das camadas da retina, o epitélio pigmentado da retina. A maioria dos doentes não apresenta alterações extra-oculares. A doença pode ocorrer em jovens ou em indivíduos de idade adulta.

Há muitas mutações que envolvem diferentes genes que podem originar a Retinose Pigmentar. Por isso, há uma grande variabilidade na apresentação desta doença. É importante avaliar a história familiar e determinar a progressão da doença.

O diagnóstico é clínico e confirmado por imagem (retinografia, autofluorescência, tomografia ótica de coerência (OCT) e angiografia fluoresceínica) e eletrofisiologia (que comprova a disfunção dos fotorrecetores).

O teste genético é fundamental para saber se doentes com esta doença são candidatos ou não a tratamento genético. De facto, o Voretigene neparvovec-rzyl (Luxturna®, Novartis) está aprovado para tratamento de doentes com Retinose Pigmentar com a mutação bialélica RPE65. Os resultados funcionais são promissores.

As medidas de apoio de baixa visão também são muito úteis para doentes com comprometimento da sua acuidade visual.

Cataratas congénitas

O cristalino é uma lente interna do olho. A catarata é a opacificação do cristalino dificultando a correta transmissão das imagens na retina. Muito raramente, a catarata pode estar presente no nascimento (catarata congénita).

No caso de haver catarata congénita, o percurso clínico é variável. Se a catarata for pequena pode não haver comprometimento da acuidade visual e, portanto, necessidade de tratamento cirúrgico. No entanto, se a catarata congénita for significativa, esta compromete seriamente a acuidade visual do bebé ou da criança e deve ser tratada cirurgicamente de acordo com a avaliação clínica feita pelo oftalmologista.

Muito mais frequentemente, a catarata forma-se com a idade: tipicamente a partir dos 60 anos. Pode ocorrer igualmente após um traumatismo ocular ou secundariamente a medicações, nomeadamente corticoides.
De acordo com dados da Organização Mundial de Saúde, a catarata é a principal causa de cegueira do mundo no adulto, após o glaucoma. Estima-se que a prevalência da catarata no mundo seja cerca de metade dos indivíduos acima de 65 anos.

O principal sintoma da catarata é diminuição da visão não melhorando com os óculos ou com lentes de contacto. Para além de uma perda quantitativa, o doente tem igualmente uma perda qualitativa, caracterizada por uma redução da perceção do brilho, do contraste e das cores, frequentemente referida pelo doente como uma turvação ou uma “nuvem” que cobre a visão. Também é frequente haver queixas de perceção das luzes (disfotopsias). Uma catarata avançada pode levar a perda quase total da visão, situação em que o doente tem apenas perceção luminosa, ou seja, só consegue aperceber-se se o ambiente em sua volta tem luz ou não. Felizmente, os avanços dos cuidados de saúde tornam esta situação rara.

Doença de Stargardt

É a doença retiniana genética mais frequente (envolve mais frequentemente o gene ABCA4). Nesta doença, há uma acumulação anómala de um material tóxico a nível da retina, a lipofuscina. que afeta os fotorrecetores da retina e uma das camadas de retina denominada epitélio pigmentado da retina.

Tipicamente afeta indivíduos jovens, ainda que haja um número pequeno de doentes com manifestações apenas após os 50 anos de idade. No geral, quanto mais precoce for a manifestação da doença, maior é a progressão e o comprometimento visual da mesma.

O diagnóstico é clínico e confirmado por imagem (retinografia, autofluorescência, tomografia ótica de coerência (OCT) e angiografia fluoresceínica) e teste genético.

O tratamento envolvia classicamente a proteção da luz solar, evitar doses elevadas de vitamina A e não fumar. Há, neste momento, muitos ensaios clínicos a decorrer que procuram encontrar uma terapia genética eficaz para estes doentes. Outra área de investigação é o recurso a fármacos (exº Gildeuretinol) que reduzam a transformação da Vitamina A (essencial para o funcionamento da retina) em material tóxico, um passo importante na patofisiologia da doença.

Nevrite ótica

A nevrite ótica é, como o nome indica, uma inflamação do nervo ótico. Pode ser unilateral ou bilateral. Está tipicamente associada à Esclerose Múltipla, mas nem todos os doentes com nevrite ótica têm Esclerose Múltipla. Uma infeção vírica ou bacteriana pode estar na origem da nevrite ótica. A investigação é essencial e, por isso, é essencial envolver a especialidade da Neurologia.
O tratamento, se implementado precocemente, é eficaz e a maioria dos doentes recupera a acuidade visual.

Maculopatia

Trata-se de um termo inespecífico e, por isso, deve evitar-se a sua utilização isolada. A maculopatia refere-se a uma qualquer doença da mácula, a parte central da retina, que é responsável pela visão central de detalhe (exº leitura, visualização das caras) e da perceção cromática da realidade.

Pode haver doenças adquiridas (mais frequentes) ou hereditárias. As hereditárias podem manifestar-se na infância ou até na idade adulta e são frequentemente bilaterais e com história familiar positiva, isto é, os doentes têm familiares com a mesma doença. Nas formas hereditárias, a maculopatia pode ser ou não acompanhado por outras patologias que não oculares (se presentes são as formas sindrómicas).

As formas adquiridas podem ser secundárias à miopia (quando esta for muito elevada, também denominada alta miopia), à Diabetes Mellitus, à Degenerescência Macular da Idade, às oclusões vasculares da retina, como também a fármacos, drogas, exposição ocular ao sol, etc.


O diagnóstico é feito clinicamente por um oftalmologista e comprovado com o recurso a exames imagiológicos da retina. O tratamento e o prognóstico variam consoante a causa e a precocidade do diagnóstico.

Retinopatia diabética

A Diabetes Mellitus (DM) é um grave problema de saúde pública. Os números variam consoante os estudos, mas acredita-se que no mundo ocidental a DM esteja presente em cerca de 7% da população adulta. Ao fim de 10 anos de Diabetes Mellitus, há uma probabilidade elevada (especialmente nos doentes com DM tipo I) de haver patologia oftalmológica secundária à DM. Esse envolvimento ocular atinge sobretudo a retina. A doença retiniana secundária à DM é denominada Retinopatia Diabética (RD).

A retinopatia diabética pode cegar. É, aliás, a causa mais frequente de cegueira legal entre adultos em idade ativa (20-60 anos) no mundo. A prevalência de cegueira devido a RD no mundo ocidental situa-se entre 1.6-1.9/100000. Por isso, é muito importante uma avaliação periódica para despiste e tratamento de retinopatia diabética (RD).

A RD é causada por um dano cumulativo dos vasos da retina. Os vasos sofrem alterações estruturais levando a hemorragias, microaneurismas e perda de líquido para o exterior dos vasos (edema macular) e, por último, tornam-se incapazes de transportar nutrientes e oxigénio para as células da retina (isquemia).

O mau controlo da glicemia (açúcar no sangue), dislipidemia (colesterol e triglicerídeos) e da tensão arterial contribuem para a progressão da doença.

Existe uma foma não proliferativa e proliferativa de RD. A forma não proliferativa pode ser tratada com fotocoagulação laser e injeção intraocular de medicação (Anti-VEGFs e Corticosteróides) que podem levar à regressão das lesões.

A forma não proliferativa pode evoluir para a forma proliferativa. Neste caso, utiliza-se a fotocoagulação laser, a crioablação retiniana e a medicação intraocular (Anti-VEGFs). Em alguns casos, em particular hemorragias extensas do vítreo ou descolamentos de retina causados pela retinopatia diabética proliferativa pode haver necessidade de submeter o doente a cirurgia.

Amaurose congénita de Leber

Também denominada Cegueira Retiniana Congénita, a Amaurose Congénita de Leber caracteriza-se pela ausência de fotorrecetores (cones e bastonetes) da retina. Trata-se, portanto, de uma patologia muito grave que condiciona acuidades visuais muito baixas, nistagmo e defeitos pupilares à luz desde a infância. O diagnóstico é clínico e confirmado por exames de eletrofisiologia.

A Amaurose Congénita de Leber é, atualmente, alvo de investigação para encontrar uma terapêutica genética eficaz. Dada a sua heterogeneidade genética (muitas mutações de muitos genes podem originar a Amaurose Congénita de Leber), essa investigação é complexa. Atualmente, está aprovado o Voretigene neparvovec (Luxturna®, Novartis) para tratamento de doentes da Amaurose Congénita de Leber com a mutação bialélica RPE65. Os resultados funcionais são promissores.

Neuropatia ótica hereditária de Leber

A Neuropatia ótica hereditária de Leber é uma doença que afeta as células ganglionares que existem no nervo ótico e na retina.

Cerca de 80-90% dos doentes são do sexo maculino, geralmente em idades jovens. É uma doença genética que envolve o ADN mitocondrial e, portanto, é transmitida pela mãe.

Tipicamente, o quadro clínico caracteriza-se por redução grave e indolor da acuidade visual. No entanto, nem todos os doentes com a mutação da Neuropatia ótica hereditária de Leber são sintomáticos. Há casos em que os doentes são portadores da doença e não sofrem a doença.

Ainda não há tratamento para esta patologia, mas estão a decorrer ensaios clínicos para a terapia genética. São também importantes o aconselhamento genético e as medidas de suporte de baixa visão que ajudam muito a melhorar o dia-a-dia de quem sofre desta doença.

Queratocone

O Queratocone (ou ceratocone) é uma doença que enfraquece a córnea e, desse modo, causa o seu adelgaçamento e o aumento anómalo da sua curvatura com prejuízo da visão. Esta alteração da forma da córnea causa níveis elevados de miopia e astigmatismo que, embora nas fases iniciais possam ser corrigidas por óculos ou lentes de contacto (mais frequentemente rígidas), nas fases tardias podem não ser suscetíveis de correção por estes meios e exigir tratamentos para fortalecimento da córnea como a aplicação cirúrgica de anéis intracorneanos ou a aplicação de medicação que, sob o efeito de uma luz especial (ultravioleta), consegue fortalecer a córnea e impedir o agravamento do queratocone (Cross-linking).

Em casos limite, aconselha-se o transplante de córnea, quer total (Queratoplastia Penetrante) quer parcial (Queatoplastia lamelar anterior, ou DALK).

O Queratocone é uma doença com uma componente genética importante, pelo que se aconselha a observação dos familiares. Está também relacionada com alergia ocular crónica e ao traumatismo ocular crónico (coçar os olhos!).

Distrofia congénita da córnea

A córnea é a lente mais anterior do olho. Há doenças genéticas que comprometem a transparência da córnea. Tipicamente, essas doenças genéticas afetam as córneas de ambos os olhos e são classificadas consoante as estruturas da córnea envolvidas.

O tratamento inclui o recurso a fármacos (de aplicação tópica ou não ), lentes de contacto, laser ou transplante de córnea (total ou lamelar/parcial).

Retinoschisis ligada ao cromossoma X

Também denominada Retinoschisis juvenil. Por estar ligada ao cromossoma X afeta indivíduos do sexo masculino e tal como o nome indica esta patologia degenerativa da retina manifesta-se em idades muitos jovens (desde a infância).

Na retinoschisis ligada ao cromossoma X, o gene envolvido é o RS1 que codifica a retinosquisina e há, por isso, interesse em fazer uma avaliação genética não só para aconselhamento genético familiar, bem como para identificar potenciais candidatos a um possível tratamento genético no futuro.

Retinopatia de prematuridade

Recém-nascidos prematuros ou pré-termo podem desenvolver doença da retina. De facto, as alterações ocasionadas pelo nascimento antes do termo (37 a 42 semanas de gestação) podem levar a anomalias da vascularização da retina e comprometer a acuidade visual dos prematuros.

Atualmente, há em Portugal um programa de rastreio de retinopatia de prematuridade. Os recém-nascidos são referenciados ao oftalmologista pediátrico por uma Unidade de Neonatologia quando o peso à nascença igual ou inferior a 1500g, a idade gestacional é igual ou inferior a 32 semanas ou sempre que a gravidez e/ou periparto tenha tido um percurso clínico instável.

De acordo com o grau de retinopatia de prematuridade, pode-se apenas observar, tratar com fotocoagulação laser, crioterapia ou anti-VEGF ou em casos extremos efetuar um procedimento cirúrgico mais invasivo, a vitrectomia.